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Dando continuidade à sua preocupação com os materiais, neste caso usando desperdícios cerâmicos de produção industrial (Fábrica Bordallo Pinheiro), a artista reutiliza-os encontrando um caminho original. Trata-se de uma leitura caleidoscópica ou multiplicada nas caixas dos “ninhos ópticos”,O título dado à instalação, tem como referência a miragem Fata Morgana, fenómeno óptico de ilusão, e a lenda fata Morgana (ou seja: fada Morgana, a fada que conseguia mudar de aparência). Trata-se de uma leitura caleidoscópica do painel ou multiplicada nas caixas dos “ninhos ópticos”, proporcionando uma nova narrativa sobre a cerâmica naturalística caldense. Surgem pedaços de irrealidade, suscitados pelo movimento do olhar ou pela curiosidade individual de espreitar. Uma intimidade poética que pode (ou não) ser partilhada na descoberta, algo lúdica, de outros lugares ópticos. Na construção desta paisagem óptica pessoal, Tocha usou a repetição de peças vegetais habitadas por animais do campo, da horta e do mar, recorrente gramática bordaliana. Mas, este mundo naturalístico de couves e frutos e animais é desconstruído pelo jogo complexo da luz, na lente ou no espelho. A diferença de escalas assumida e a pose estática, agora multiplicadas, podem indiciar uma visão humorística. Outra lente usou o artista Rafael Bordalo Pinheiro (1846-1905) na sua obra cerâmica e gráfica: o monóculo! Através dele observou até ao pormenor, num gosto naturalista, conforme a sua geração artística assim lhe pedia. Mas também, tantas vezes, aumentando aspectos da figura até à caricatura, em desenho e no barro. Tocha e Bordalo partilham este gozo pessoal de sala de espelhos ou lentes que alteram o real, provocando o outro. Se em Bordalo os seus animais (e os vegetais) não escaparam à antropomorfização, colocando-os em atitudes do quotidiano humano, em Tocha vemos os animais ao espelho “em casa alheia”, insinuando personalidades.
(Pedro Bebiano)
Museu Bordalo Pinheiro | Lisboa
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EN
This exhibition represents the most recent work of the Portuguese artist, Andreia Tocha. With the ceramic work of Rafael Bordallo Pinheiro (1846-1905) as her chosen point of departure, her practice exploring light is guided towards yet another dimension of perception. The lens and the mirror impart a fragmented multiplicity to the colorful Bordallian shards. Giving continuity to the artist’s concern with her choice of materials, she reinvents detritus from the historic ceramic factory in Caldas da Rainha, finding her own unique and original path. Whether through the kaleidoscopic effects of the large panel of lenses, or infinitely multiplied in the birdhouses, where she has created ‘optical nests’; these works propose new narratives around these idiosyncratic naturalistic ceramics. There arise bits and pieces of unreality, provoked by the movement within the installation and by the viewer’s curiosity, impelling them to peek into the habitats. This poetic intimacy, which may or may not be a shared discovery, is a playful journey to another optical place. In the construction of this personal optical landscape, Tocha employs vegetable forms, and animals from land and sea. All of which are recurrent vocabulary from the visual language of Bordallo Pinheiro. In this new setting, however, his naturalistic world of flora and fauna is deconstructed by a complex play of liight, whether through lenses or reflected in mirrors. This juxtaposition between the different scales of the creatures and their static postures, now multiplied and distorted, imparts a humoristic vision, in keeping with the original intent, while encouraging a fresh perspective, unimagined by the author. Another lens used by the artist Rafael Bordallo Pinheiro, both in real life, as well as in his creative work – was the monocle. Through this lens he observed in great detail his contemporaries, frequently enlarging certain aspects of their figures to the point of caricature, both on paper and in clay. According to his humoristic intentions, the artist played with scale and proportion, often using the same lens to either exaggerate or miniaturize figures and objects. Andreia Tocha and Rafael Bordallo share a personal enjoyment in lenses that alter our perception of reality; halls of mirrors and the distortion of space in order to provoke other realities. Bordallo’s animals and vegetables do not escape anthropomorphism, as here they have been given quotidian attitudes. Through Tocha’s interpretations, we see the animals pondering their own reflection at the mirror or as unexpected guests in astranger’s home, taking on their own distinct personalities.
(Pedro Bebiano)
Museu Bordalo Pinheiro | Lisboa